Esta semana temos o regresso do consagrado Tiago Chan (ex-campeão nacional e vencedor do último Invitational) à escrita, para nos descrever como foi o regional que ocorreu em Sines, onde se qualificou.
Vale a pena ler!>
Olá a todos, sou o Tiago Chan e este é o report da nossa aventura antes, durante e depois do Regional em Sines, a minha pequena contribuição para que se continuem a ver artigos sobre Magic escritos em Português. É uma história engraçada, com um final feliz para uns, menos feliz para outros, mas peço desculpa se o nível da estratégia não for muito elevado pois estive uns anos sem jogar.
Uma pequena introdução para os que não me conhecem. Joguei Magic mais ou menos a sério durante largos anos, no início de 2008 fui estudar para a China. Comecei a dar outra importância aos estudos a preocupar-me com coisas sérias como empregos e futuro, e pensei que o Magic tinha ido de vez. Na altura, apesar de estar qualificado nem sequer fui aos Nacionais de 2008 nem de 2009. Cheguei a Portugal no final de Março e em principio devo ficar uns meses a tratar de burocracia, e pensei que podia matar saudades e ir ao Nacional. Devo referir que já não tenho especial interesse na competição do Magic, nem em Pro Tours ou PTQ’s, mas gostava bastante de ir ao Nacional, porque costuma ser em Lisboa, é divertido e revejo muitos amigos. Após pesquisar um pouco, descobri que pela primeira vez desde 2000, não estava qualificado para o Nacional.
Aqui tinha duas hipóteses, ou ficava a queixar-me sobre as novas mudanças ao ranking total onde devem ter contado os meus 1504 de 2 Headed Giant, mais ao facto de nos últimos dois anos ir jogar Grand Prixs sem conhecer as cartas, o que provavelmente me des-qualificou o ranking para o Nacional, ou então calava-me e ia fazer alguma coisa em relação a isso. Não tinha grandes expectativas para os Regionais, mas decidi que ia jogar nos que pudesse, para no caso de não me conseguir qualificar, pelo menos saber que fiz o que podia.
Falando de Standard, a última vez que joguei Magic, Tarmogoyf jogava em T2. Passaram-se alguns anitos, é certo, mas mesmo sem jogar costumo dar uma olhada pelos sites de Magic e sabia que Jund era o deck dominante. No final de Março vi umas decklists, e como só faltavam uns dias para o primeiro Regional e ainda nem sequer tinha visto as cartas achei que o Mono-Red era a melhor escolha, não que achasse ser o melhor deck, ou escolha de metagame, mas porque o game plan parecia-me fácil de executar.
O meu amigo Tiago Fonseca diz-me que o deck certo para o metagame de 3 de Abril era o White Weenie, e que o Luis Ribeiro podia montar-me o deck quase todo. A argumentação dele foi bem feita, os resultados tambem comprovavam, mas eu não queria jogar de White Weenie, sinto-me sempre um pouco underpowered a fazer 1º turno Suntail Hawk e coisas do género, e a grande diferença White Weenie não tem Burn para acabar o trabalho, ou leia-se estar a chumpblockar um jogo perdido à espera de uns topdecks seguidos.
O Frederico Bastos achava que havia um deck que também era boa escolha, era um Bant que tinha ficado em 2º lugar num Grand Prix naquela altura. Fui ver a lista, e fiquei pasmado, o deck tinha 30 e tal criaturas e 3 Encantamentos que permitem-te atacar outra vez. Fez-me lembrar o Goblins do Smuve há uns anos em Extended, 36 Goblins e 4 Moxes, e eu disse nunca hei de jogar com um deck só de criaturas. Normalmente os meus decks têm 30 e tal spells e 3 criaturas, e mesmo em Limited têm mais frequentemente menos de 10 bichos do que mais de 13. Basicamente, criaturas sempre suckaram em Magic, mas nos últimos anos parece haver um push da Wizards para que elas sejam mais competitivas em torneios, e assim sendo, vamos deixar-nos ir com a onda. Achei que este deck tinha bichos maiores e melhores que o White Weenie, e pareceu-me que me ia divertir mais a jogar com este deck do que o Branco. É claro que o factor chave foi entregarem-me o deck montado, com excepção de uma carta que passo a explicar mais à frente. Obrigado ao Frederico Bastos, Luis Ribeiro e ao Pedro Pereira (Rossa).
Maindeck:
4 Baneslayer Angel
4 Birds Of Paradise
4 Knight Of The Reliquary
4 Lotus Cobra
4 Noble Hierarch
4 Rhox War Monk
3 Rafiq Of The Many
2 Sphinx Of Jwar Isle
1 Thornling
3 Finest Hour
5 Forest
2 Island
1 Plains
4 Celestial Colonnade
4 Misty Rainforest
2 Sejiri Steppe
3 Stirring Wildwood
2 Sunpetal Grove
4 Verdant Catacombs
Sideboard:
1 Dauntless Escort
3 Qasali Pridemage
2 Mind Control
2 Vapor Snare
1 Harm’s Way
4 Negate
2 Path to Exile
As mudanças ao deck foram 2 Path to Exile no sideboard em vez de 2 Cóleras. Queria ter Path não sabia o que cortar, contra Mono Red e Jund pareciam-me um pouco mortas e era o que estava à espera que houvesse mais, de modo que talvez incorrectamente elas foram cortadas. O Thornling já tem outra explicação, esta muito mais comum: não arranjei! Combinei jantar com o pessoal no Fogo de Chão a ver o Benfica-Liverpool, na véspera de ir para o Algarve trabalhar, e a dois dias do Regional de Sines, para me entregarem o deck. Estava a faltar um Thornling e já não tinha muitas oportunidades de o arranjar. Estou na conversa com o Fred Bastos e a sugerir por Battlegrace Angel em vez, porque também custa cinco mana, tem Exalted e entra no espírito do deck, mas ele contrapõe com uma tal Sphinx of Jwar Isle, e lá vou eu ter de ler a carta ver o que faz. Não tendo experiência para discutir Magic recente, acabo por concordar, viro-me po Fred e pergunto “Tens mais uma?” Ao que o emprego do fogo de chão que me esta a cortar a picanha me responde “Um momentinho senhor, vou buscar lá dentro”. Awkward!
Na véspera do Regional e já no Algarve ligo ao Fábio Rodrigues para marcarmos a viagem a Sines. O torneio começava às 15h, mas como não sabíamos onde era, resolvemos sair às 9h30 e almoçar com o pessoal da margem sul lá em Sines. Estamos no carro do Fábio, eu, ele e a minha namorada aí por volta de Aljustrel, quando se acende a luz que indica falha no sistema de emissões. Lá começamos a falar que o carro deve ir a deitar fumo em demasia e que quando voltássemos ele devia levar aquilo pa arranjar, mas quando ele sente o motor a perder força achamos que é melhor parar na área de serviço e ver o que se passa. E era precisamente o contrário parecia é que não saía fumo, e nisto o motor perde a força toda e já não mete a segunda.
Vamos à procura do mecânico da área de serviço, e como era óbvio, fim-de-semana de Páscoa ele não estava. Ligamos para a assistência na estrada da Brisa, esperamos, mas eles também não conseguem resolver o problema porque o problema não era mecânico era eléctrico. O que sobra? Ligar para o seguro para mandarem reboque e dar o dia como perdido. Quando o reboque vem, somos informados que agora o seguro pagaria um Táxi até ao local de partida no Algarve, ou até ao nosso destino, Sines. Já só estávamos a 70 kms de Sines, com isto tudo pouco passava da 13h30 e resolvemos ir à maluca para Sines e voltar depois de comboio. Chegámos um pouco antes do torneio começar.
Ronda 1: Naya
Ganhei 2-0, pareceu-me um bom matchup, mais problemático pós sideboard porque eles têm os bichos vermelhos que dão 1 ponto de dano, mas eu tambem sidebordo solução para eles, eles melhoram o confronto pós sideboard, mas no geral da ronda acho que na maior parte das vezes o Bant ganha. Provavelmente já devem saber isto, pois eu fiz um total de 4 rondas com o deck, e esta foi a primeira. Um dos jogos foi muito equilibrado porque fiz keep a uma mão que só fazia terceiro turno Knight of Reliquary ou Rhox War Monk, e não melhorou muito, mas Baneslayer lá acabou por resolver.
Ronda 2: Jund
Antes do torneio disseram-me que até era equilibrado vs Jund que é o melhor deck e possivelmente o mais jogado, mas achei que estavam a mentir, porque as pessoas têm sempre tendência a dizer que o deck delas é bom contra o melhor deck do formato, como forma de justificarem a escolha, e quando o matchup não é lá muito bom dizem que é equilibrado, o que regra geral é mentira, pois se todos falassem verdade então o melhor deck do formato não seria o melhor deck.
Ganhei 2-1 graças a uns mulligans da parte dele, e achei que foi muito difícil apesar de tudo, e que tive bastante sorte em ganhar. Não achei que fosse bom matchup e preferia se possível evitar.
Ronda 3: Naya
Tive sorte no pairing, nesta altura precisava de fazer 2-1 nas próximas 3 rondas. Ganhei 2-0 e com isso só precisava de fazer 1-1 nas 2 seguintes o que deixa respirar um pouco.
Ronda 4: Bant
Mesmo entre dois decks aggressivos há vários tipos de mirror match. Por exemplo, entre dois Zoos, que têm ambos criaturas e removal numa fórmula standard muitas vezes o jogo é uma batalha de atrito. Outros casos, como Affinity com cartas na altura como Cranial Plating, Disciple of the Vault e Ravager que priveligiam o ataque, há um jogador que tem um draw que o põe à frente e há outro que está desperadamente a lutar apenas para não morrer. Com o Bant acaba por ser semelhante por causa do “exalted” quem está a atacar está em muito melhor situação do que quem está atrás. Foi o que aconteceu nos 3 jogos, mas em 2 deles eu tive a essa tal vantagem e ganhei 2-1.
Ronda 5: Intentional Draw
Fui jantar porque não comia nada desde o pequeno-almoço. Quando voltei, estava à espera que o Fábio tivesse ganho e ficasse 4-1 para ele também poder fazer ID a seguir e irmos 1 hora mais cedo à procura de transporte para o Algarve. Não foi o que aconteceu, ele perdeu, estava 3-2 e a ver se tinha hipóteses de passar 4-2. Após ler os Standings, conclui que havia um 4-2 que passava, com boas hipóteses de esse 4-2 ser o Fábio se ele ganhasse, mas só e apenas se, um dos 4-0-1 jogasse contra um 4-1 e mandasse esse 4-1 para o bracket dos 4-2 onde competiria em tie-breakers pelo slot que faltava- Se esse 4-0-1 empatasse, seria clean cut aos 13 pontos. Obviamente que o 4-0-1 paired down fui eu, e muito a contra gosto porque não queria estar a estragar o torneio de alguém e a qualificação para o Nacional, tive de jogar para ajudar o Fábio.
Ronda 6: Jund
Estava a perder 0-1 quando o Fábio anuncia que tinha perdido. Sendo assim ofereci o empate ao meu adversário que o aceitou, e qualificámo-nos os 2. Neste altura estava mais preocupado em devolver as cartas e ir rápido para a estação de comboios, mas jogando meio sem prestar atenção conclui o segundo jogo e perdi, dava para ganhar se tiivesse jogado bem, mas provou que o matchup contra Jund não é muito bom.
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Feliz com a qualificação para o Nacional, ainda havia o problema de regressar ao Algarve. O último comboio já tinha partido, e não havia camionetas para o Algarve. De nada nos adiantava ir de camioneta para outra terra no Alentejo porque Sines já é a maior terra daquela zona. Já por volta das 21h, vamos a uma "random" Praça de Táxis tentar negociar uma viagem para o algarve uns 170 kms, por 100 euros. Só lá havia um Táxi, um velho que disse nem pensar, 150 euros para cima. Recusámos e fomos à procura de alternativas, mas não encontrámos mais Táxis nenhuns nem sequer em frente aos comboios. Por esta altura já estava a pensar em abancar na estação até ser de manhã e depois apanhar o comboio. Já fiz isso por causa de Grand Prixs em várias cidades do mundo que não conhecia, Birmingham, Londres, Cardiff, Turim, Munique, enquanto esperava transporte. Mas aqui tinha um problema, a minha namorada estava comigo e eu sabia que muito em breve ela não ia aguentar com esse plano. E estar a pagar alojamento num sítio qualquer, mais bilhete de comboio no dia seguinte, ia dar ao mesmo preço que a situação mais práctica que era o Táxi.
Voltamos à Praça de Táxis inicial, mas o velho quando nos vê a chegar liga apressadamente o carro e vai-se embora, deixando-nos ali sozinhos, mesmo como quem diz, ah não quiseram antes, pois agora que se lixem. Após mais uns longos momentos de “e agora?” temos a feliz ideia de ligar para as informações a pedir o número dos táxis de Sines. Ligo para o número dos Táxis e de repente começo a ouvir um telefone a tocar ao pé de nós. É verdade, eu estava do meu telemóvel a ligar para um random telefone no meio da rua, mesmo em frente ao sítio onde o velho tinha o Táxi estacionado.
Oops...
Nisto começo a fazer uns telefonemas para Lisboa a ver se há alguém que nos queira vir buscar por 100 Euros, mas entre uma desculpa e outra, ou alguns mais frontais percebo que jogadores de Magic em regra são preguiçosos, e que a alternativa mais comum a eles todos era mesmo o desenrasquem-se por aí. Lá deambulamos mais um pouco à procura de algo, encontramos um café ainda com movimento porque tava a dar um jogo qualquer da Liga Espanhola, vamos lá ao Balcão e explicamos a nossa situação. A senhora diz que tem ali um número de um Taxista que pode fazer esse serviço, eu pergunto se ela o conhece, ela diz que sim, que ele é de confiança, e pareceu-me nesta altura ser o melhor plano, a menos que este taxista fosse o velho.
Felizmente não era, e vamos então para baixo, eu e o Fábio sempre à coca porque já passava da meia-noite, e estávamos a ir para o Algarve por umas estradas mais suspeitas para poupar Kms, para quem conhece, não era a A2, nem o IC1, é umas estradas ali mais junto ao mar, de Sines até Lagos, passando pela Zambujeira do Mar, Odeceixe, etc. Por acaso, o motorista também tava sempre a receber telefonemas a toda a hora e sempre a dizer, tá tudo bem. Mas o que é que isto significa? Que nos vai raptar e tem um cúmplice nalgum sítio? Ou mais provavelmente era alguém da família em casa também preocupado com ele, já que à meia-noite recebe um telefonema de 3 pessoas que querem percorrer 170 kms.
Quando chegámos, ainda tive de ir levar o Fábio a casa, mas tudo está bem quando acaba bem, o mais importante estava alcançado, a qualificação para o Nacional. No entanto, pensem no Fábio, passou por tudo o que eu passei, mas não se qualificou, e além disso o carro ainda foi para a oficina, claramente um dos piores dias da vida dele. Para expressarem a vossa solidariedade com o Fábio, podem fazer donativos em dinheiro ou cartas para mim, que eu recolho e dou a ele. 80% das receitas revertem a favor da Fundação “Tiago Chan”, instituição de caridade para o auxílio a ex-jogadores profissionais de Magic que de vez em quando ainda querem jogar.
Obrigado a todos por lerem, e boa sorte para os Regionais!
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