zgordi_fly De: Portalegre 6/28/2006 1:14:57 AM | Desqualificação do Rui Mariani no ultimo GP Barcelona....vale a pena ler!
A desqualificação do Rui Mariani por Frederico Bastos e Luis Ribeiro
No último GP Barcelona aconteceu algo que eu penso merecer um artigo: a desqualificação do Rui Mariani. Espero que este seja um artigo não só informativo como educativo, para que alguns jogadores menos experientes saibam o que acontece em torneios de alto nível. Pedi também a ajuda do Luis Ribeiro que poderá dar não só o ponto de vista de um árbitro, como também o de um árbitro que estava presente no próprio torneio.
Para começar vou falar nos factos, ou seja, o que aconteceu nesse GP. No primeiro dia o Rui estava no torneio verde (para quem não sabe, os GP’s com mais de 800 pessoas são divididos em dois torneios, o verde e o azul) e tirando partido dos seus três byes acaba o dia em 11º lugar entre mais de 1200 jogadores, com uns respeitaveis 24 pontos em 27 possiveis. No dia seguinte levanta-se cedo para ir para o draft e eu chego ao site ainda no inicio do draft. O Rui estava de costas para mim, o que era perfeito para eu perceber as cartas que ele ia draftando. O outro português que estava à "mão" era o Rodrigo Borba que estava na mesa ao lado e então eu ia dividindo o meu tempo pelos dois portugueses.
Enquanto estava a ver o draft do Rodrigo, reparo que um dos árbitros começa a falar com o head judge e vai apontando para a mesa do Rui, enquanto faz uns sinais que eu facilmente percebi referirem-se às riscas do casaco do Rui. Percebi logo o que se estava a passar e comentei com os amigos do Rodrigo que algo de mal se passava com o draft do Mariani. Quando o draft acabou, mandaram toda a gente regressar aos seus lugares, excepto o Rui, que ficou sentado na mesa de draft rodeado de três árbitros. Ainda pensei que nada de muito grave fosse acontecer, mas passados dez minutos de conversa vejo-o sair de lá muito chateado e veio dizer-me que tinha sido desqualificado por olhar para as cartas que os seus vizinhos draftavam.
Bom, penso que esta será a melhor altura para contar um incidente que se passou comigo uns três meses antes. No GP Hasselt, também tinha passado ao segundo dia e estava alegremente a draftar quando a meio do draft vejo alguns árbitros a colocarem-se estrategicamente na minha mesa e penso para comigo: "He he, já há algum coitado que se vai lixar neste draft!". Quando o draft acaba, mandam toda a gente regressar aos seus lugares excepto EU! O head judge senta-se ao meu lado e começa com um discurso altamente paternalista, a dizer que estava a ter esta conversa comigo para o meu bem, que eles tinham ficado com a impressão que eu estava a olhar para as cartas dos meus vizinhos mas que depois tinham percebido que se tratava apenas de um "tique" que eu fazia com a cabeça e que dava essa impressão e que não me ia acontecer nada, apenas um aviso verbal para eu ter mais cuidado. Depois do choque inicial e de me ter mantido calado a ouvi-lo, "passei-me" e desatei a falar. Disse que achava incrivel o que me estavam a dizer, que, ainda por cima, tinha feito um esforço sobre-humano para não olhar para as cartas dos meus vizinhos e que nem sequer fazia a mais pequena ideia do que eles estavam a draftar, para além dos sinais obvios que os boosters traziam. Disse que parecia uma caça às bruxas e que deveriam tomar medidas, como, por exemplo, separadores nas mesas, para que não voltasse a acontecer um disparate destes, ao qual ele me apontou para uma caixa onde eu poderia depositar sugestões (coisa que, confesso, não tive paciência para fazer!).
Voltando ao GP Barcelona, quando vi os árbitros com o Rui, estava com alguma esperança que lhe fosse acontecer o mesmo que a mim, mas não, desta vez desqualificaram mesmo! Depois de acalmar, o Rui disse-me que não tinha olhado para as cartas e que tinha sido alvo de uma grande injustiça. Disse também que já não tinha idade para aturar malucos e que no dia anterior tinha jogado o seu último jogo de sempre de Magic. Bom, isto pode parecer um exagero, mas a meu ver nem é, porque para mim não existe pior coisa que uma pessoa ser condenada por um crime que não fez. Ora, com estes factos, que conclusões se podem tirar? Eu penso que alguma coisa está mal, quando fazem com que um jogador, que joga o jogo há mais de dez anos, pense seriamente em deixar de jogar. O Rui sabia o que me tinha acontecido, e ainda por cima tinha aberto um Glare of Subdual (provavelmente a melhor carta do bloco de Ravnica para draft), penso que não tinha necessidade nenhuma de arriscar ser apanhado e desqualificado. Mas eu também sei que um head judge não desqualifica ninguém sem motivos suficientes, e neste caso teve três árbitros diferentes a dizerem-lhe que o Rui estava a olhar. Eu próprio acho que o head judge teve pouca escolha no que fazer, o que me preocupa é que três árbitros diferentes fossem dizer uma coisa que não aconteceu. Como é que é possivel?
Mais tarde percebi que o Rui também tinha uns pequenos "tiques" quando tinha que pensar que carta draftar, e pelos vistos isso foi o suficiente para enganar estes árbitros. Mas se tanta importância se anda a dar a isto, porque é que a Wizards não toma medidas mais especificas para proteger os jogadores? Será assim tão dificil criar separadores nas mesas? Fabricar uns óculos especiais para tapar o ãngulo de visão? Embora estas sugestões possam parecer ridiculas, penso que são necessárias para garantir que injustiças como estas não voltem a acontecer, porque acho que não são boas para o jogo. Enquanto conversava com alguns "pros" e lhes contava a história, eles também disseram que o que se estava a passar era insopurtável, que em todos os GP’s e PT’s alguém era desqualificado e que uma pessoa neste momento está mais preocupada com o que os árbitros estão a fazer do que com o draft propriamente dito, e isso é um sinal de que as coisas não estão bem.
Eu sei que posso parecer pouco imparcial, por se tratar de um dos meus melhores amigos, por isso convidei o Luis Ribeiro para poder dar o ponto de vista do árbitro e tentar dar algumas sugestões de como evitar este tipo de situações. Sem mais demoras, Luis:
Luís Ribeiro:
“Neste assunto eu tenho o privilégio de ver os dois lados da questão: O lado dos jogadores e o dos árbitros. Sinceramente acho que o facto de eu jogar e arbitrar me dá uma posição excelente para avaliar esta situação.
Se alguém me perguntasse, antes do evento, se o Rui poderia eventualmente espreitar as cartas do companheiro do lado no draft, eu diria que não. Eu não conheço o Rui muito bem, mas o pouco que conheço dele é suficiente para perceber que é uma pessoa simpática e com muito Fair-Play. Como árbitro é bom traçar o perfil dos jogadores e, sinceramente, o Rui é dos jogadores que me deixa mais descansado em qualquer evento em que participa. Ele tem uma postura muito relaxada face a este jogo e por isso, eu diria com toda a segurança que ele nunca se iria encontrar nesta situação.
No entanto, o que deve ser compreendido é que esta situação não significa nada. Quando eu arbitro um torneio onde o Rui participa, ele não é um jogador com quem não tenho que me preocupar, é apenas um jogador. O facto da sua atitude ser excelente não lhe dá nenhuma vantagem comigo, porque isso seria injusto para os outros jogadores. Agora, se virem isto a uma escala europeia (e na escala do GP em questão), o Rui é de facto só mais um jogador.... no 2º dia de um GP! Isto é uma competição de alto nível (tirando os PTs, é a mais importante competição de Magic no mundo) e como tal, exige atenção extra, tanto dos árbitros como dos jogadores. E tendo em conta que três árbitros viram o sucedido, então a desqualificação do Rui é completamente acertada.
Isto leva-nos à questão fundamental desta situação: Será que o Rui realmente fez aquilo de que é acusado? Certamente que ele diz que não, com tanta ou mais convicção do que os árbitros que presenciaram a situação dizem que sim. Eu, se estivesse perante esta situação antes de me tornar árbitro, diria claramente que o Rui foi tramado, mas agora, tendo também conhecimento deste mundo pela perspectiva de árbitro, digo claramente que os árbitros em questão realmente viram o Rui a olhar para as cartas do adversário.... mas eu continuo a acreditar no Rui. Então onde ficamos? Na verdade, a minha opinião é que ambos têm razão. Eu acho sinceramente que o Rui não teve intenção de ver as cartas dos seus adversários, mas por alguma razão olhou para elas (porquê não sei, mas como não presenciei, não posso elaborar mais).
A questão é que neste tipo de evento, as situações, as acções e as intenções podem ser mal interpretadas. O que eu acho é que o que os árbitros viram foi realmente o Rui a olhar para as cartas do adversário, embora ele provavelmente estivesse a fazer outra coisa.
Então, estou a dizer que o árbitro errou?
Não, antes pelo contrário, eu apoio a decisão de desqualificação. Porquê? Por uma questão de precedente. Um árbitro não deve julgar a intenção de um jogador neste caso. Se se deixarem passar estas situações, em breve qualquer um olha para o draft do vizinho do lado com a desculpa de que não foi de propósito e isso é inadmissível.
Por outro lado, acho também inadmissível que os jogadores sintam que está a decorrer uma caça ás bruxas no que toca a esta situação. Nisto, dou completa razão ao Fred, se estamos a dar tanta importância a este factor, então o melhor é mesmo certificarmo-nos fisicamente de que os jogadores não o podem fazer. Assim estaremos a zelar pelos interesses do Jogo, dos jogadores e da Wizards (porque qualquer acção que seja tomada para contentar os jogadores, é benéfica para a Wizards).
Eu pessoalmente não fazia ideia de que esta situação nos GPs se estava a tornar uma “caça ás bruxas”, como lhe chamou o Fred. Não acho que isso seja verdade da parte dos árbitros, mas a verdade é que se os jogadores se sentem perseguidos, mesmo que não estejam a sê-lo, algo tem que ser mudado. Dai, proponho-me aqui a tentar conversar com os responsáveis para passar a ideia do Fred. Sinceramente não sei se fará alguma diferença (não tenho garantias de ser ouvido), mas como acho que é uma boa ideia, vou fazer o possível para implementá-la ou algo parecido com os mesmos resultados práticos.
O mais importante no papel do árbitro é passar despercebido. É fazer com que os jogadores só se tenham que preocupar com o jogo. Se os jogadores se distraem do jogo porque pensam que têm que se defender dos árbitros, então não estamos a fazer o nosso trabalho da forma mais correcta.
Espero que tenham percebido o meu ponto de vista e sobretudo o ponto de vista dos envolvidos (o Rui e o árbitro que viu a sua infracção). O árbitro em questão (eu sei quem foi, mas obviamente não vou revelar... nem a sua identidade interessa para nada neste caso) é um árbitro extremamente experiente e de grande qualidade e como tal, tenho a certeza absoluta de que ele julgou bem a situação, mas isso não significa que o Rui tenha feito algo de reprovável, apenas significa que os seus movimentos podem ser interpretados dessa forma.
Concluindo, só quero que todos percebam o que realmente se passou no evento e que não comecem a culpar os árbitros por algumas coisas que correm mal. Mesmo que esta decisão tivesse sido um erro, os árbitros também são humanos e num GP, passamos mais de 30 horas (ao longo dos dois dias) a trabalhar para o bem do jogo. É normal que algo corra mal... o estranho é que da maior parte das vezes, não há problemas. Se vocês vissem o que algumas destas pessoas fazem, de certeza que iriam partilhar da minha opinião acerca deste assunto.
Luis Ribeiro
DCI Level 2 Judge
Escolhi este artigo,porque acho interssantissimo,é extenso (peço desculpa) mas vale a pena ler!
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